sábado, 27 de junho de 2009

A importância do jornalismo acadêmico

Nos últimos meses um alvoroço, em debate no campo jornalístico brasileiro, foi intenso e as observações foram para o Supremo Tribunal Federal que tinha duas grandes decisões: sobre a lei de imprensa e a obrigatoriedade do diploma para exercício da profissão de jornalista. Sobre a última, há alguns dias o STF decidiu, por oito votos a um, que a obrigatoriedade do diploma é inconstitucional, pois o direito de liberdade de expressão é de todos e não apenas de quem tem diploma, ou seja, não é preciso necessariamente que alguém tenha um diploma para exercer o jornalismo.
Mas o fato de se exigir até agora o diploma, não impediu ninguém de manifestar sua opinião; se pensarmos no campo dos veículos de comunicação, embora saibamos de seus perfis, existem espaços reservados a opinião do leitor e para artigos de opinião que são escritos não necessariamente por jornalistas diplomados. Se pesarmos, também, que o diploma exigido para ser jornalista anula ou restringe a liberdade de todos se expressarem, é o mesmo que inferir que o trabalho do jornalista é apenas emitir opinião e/ou colocar em prática seu direito de expressão, o que precipuamente não é, embora saibamos das características da ideologia na imprensa brasileira. O jornalista não um mero emissor de opinião e/ou manifestante de suas expressões, o jornalista é um profissional capacitado para se comunicar com a sociedade, utilizando dos domínios teóricos e técnicos das linguagens jornalísticas.

Outro ponto importante alegado pelos ministros que votaram a favor da extinção do diploma, é que o exercício do jornalismo é mais intelectual que técnico e mesmo sem essa técnica (para esses ministros quase inexistentes) não colocaria em risco a sociedade, como um médico ou engenheiro que se não souber das técnicas mínimas para exercer suas respectivas profissões, poderiam causar sérios danos a sociedade. Isso não é verdade! Acredito que o exercício intelectual é importantíssimo para a prática de qualquer profissão, mas é ainda mais primordial no campo do jornalismo, afinal grandes escritores trabalharam como jornalistas e sem diploma como Machado de Assim, José de Alencar, Graciliano Ramos, Antonio Conselheiro, todavia a prática do jornalismo exige técnicas, e sem as técnicas o jornalismo poderia contaminar a sociedade com informações equívocas, deturpadas. O que será que estudantes de jornalismo fazem quatro anos na faculdade? Ficam aprendendo a serem intelectuais? Não! Aliás, deveria ser também, mas cada meio de comunicação exige uma técnica diferente, o jornalista deve entender cada linguagem, dominar o processo de comunicação para obter êxito. Essas técnicas são ensinadas na academia para que o profissional formando tenha conhecimentos dessas técnicas, para aplicá-las no exercício de sua profissão. O jornalismo não é uma arte, é uma ciência e, como toda ciência, tem seus corpos empíricos, suas teorias, seus objetos de investigações.

Não é qualquer pessoa, por mais intelectual que seja, que poderia escrever uma reportagem para um jornal, dentro dos parâmetros da linguagem jornalística, quanto ao lide, a busca e adequação da fonte, apuração precisa e contextualizada do fato. Também, por mais intelectual que alguém seja, seria difícil fazer um texto em linguagem radiofônica ou ir para uma assessoria de imprensa sem dominar as técnicas de cada canal. Portanto, acredito que a profissão de jornalista é essencial para a manutenção de uma sociedade livre e com direito de saber o que acontece no meio de forma clara, objetiva e verídica garantido a todos o direito a informação. Mas é necessário técnicas para exercer essa profissão, as técnicas se aprendem na academia. O exercício do jornalismo é uma atividade intelectual, mas exige técnica; é necessária uma congruência das duas, senão teremos o risco de termos uma sociedade a mercê das informações inverídicas e levianas. Se alguém pensa que não há danos a sociedade, um jornalismo sem parâmetros de técnicas e ética, o que poderia acontecer em um país cuja imprensa usurpa a opinião publica, onde foi e é capaz de conspirar para manutenção de regimes antidemocráticos, se é capaz de decidir a agenda do debate nacional, intrigar, comover e provocar escândalos no país, utilizar do seu” Quarto Poder” para manter uma ideologia dominante nas mãos de uma elite fracassada, então, que abolam o diploma para ver no que dar, mas eu não quero pagar pra ver, ouvir nem ler.

domingo, 21 de junho de 2009

Democracia à arte no Gamboa Nova

Desde 1974 o Teatro Gamboa Nova abre suas portas para o público e as cortinas para a arte. Mesmo de forma intermitente, a Gamboa é um centro cultural onde arte é democratizada, coisa que precisamos : o acesso aos bens culturais artísticos. O minúsculo e aconchegante teatro é um ambiente tão pequeno quanto confortável; com dois espaços para platéia, inferior e superior. Com cadeiras de vime e forrada com pano vermelho, assim como as cortinas, o que dar uma sensação de familiaridade pela proximidade entre público e palco; parece até uma casinha de boceca.

O Gamboa Nova se destaca pelos bons espetáculos de música, teatro, dança e exposições gerais. O preço simbólico de cinco reais (preço único) é para levar todos a conhecer o mundo mágico das artes. De quinta à domingo tem espetáculo; pela semana o espetáculo é musical, sempre às 20 horas e com o mesmo valor de cinco reais, além de contar, também, com teatro infantil que é sempre às 17 horas, mas esse sempre sábados e domingos.

Ontem fui à primeira vez ao Teatro Gamboa Nova e fiquei encantado pelo local. O espetáculo foi Quem tem medo de D. Margarida? Um monólogo com a atriz Cecília Moura. D. Margarida é uma professora no primeiro dia de aula (a classe é a platéia) do quinto ano ginasial. Com métodos autoritários, a professora é uma mulher desequilibrada que ensina que forma muito estranha biologia, história, português e matemática. Segundo D. Margarida, seu método pedagógico é uma salvação para a humanidade. O espetáculo é muito interativo e humorado e a atriz Cecília Moura é uma proeza na arte da interpretação.

O Tetro Gamboa Nova Fica na Rua Gamboa de Cima, Aflitos, próximo ao Campo Grande, atrás do Teatro Vila Velha. Para ver a programação da semana acesse: http://www.teatrogamboanova.com.br/

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Lenda do jazz: a biografia de Ella Fitzgerald

Ella Fitzgerald foi uma cantora que conseguiu a glória e a ovação nos palcos do mundo em quase sete décadas de carreira e Stuart Nicholson, seu biógrafo, nos conta como foi essa trajetória de uma das mais belas e conhecidas vozes do jazz e da música popular do século XX.

Ella Fitzgerald, uma biografia da primeira-dama do jazz, não é uma biografia para fã saber sobre toda vida pessoal de uma artista; apenas o primeiro capítulo mostra um pouco de sua infância e onde vivera, afinal Ella escondia a sete chaves seu passado e Stuart Nicholson, teve a indelicadeza de supor que ela foi abusada pelo seu padrasto na infância e que fez um aborto quando jovem a impendido de gestar, adotando uma criança mais tarde.

Ella nasceu na Virginia, EUA, em 1917. Negra e de família pobre, ficou órfã muito cedo e acabou nas ruas. Seu maior sonho era conquistar o palco pela dança, mas foi à música que lhe tirou das ruas para qualquer lugar onde seus sonhos mais ambiciosos pudesse lhe proporcionar, inclusive à Dinamarca, onde morou por um ano.

Por ser negra e moradora de rua, teve dificuldades em participar de programas de calouros, sendo até impedida de receber um prêmio de primeiro lugar em uma boate, pois a considerava feia [sic]. Logo ingressou na banda de Chick Webb, mesmo Webb resistindo que Ella entrasse na banda devido a sua aparência não convencional, mas ela levou a banda ao estrelato em 1938, dois anos depois de ter ingressado, nos tempos do jazz swing, quando jazz era música para dançar e para as massas e Webb, que sonhava com o estrelato viu em Ella o caminho de sua gloria por poucos meses, pois morrera em 1939.

Com Dizzy Gillespie, pai do jazz be bop, excursionou com sua banda na nova vertente do jazz, que agora das boates das periferias ia para grandes clubes, salas de concertos e prestigiadas casas noturnas dos EUA. Ella transitou do swing para o be bop com êxito e já nos anos 50 era uma cantora mundialmente conhecida; cantava para platéias do EUA, Europa e Japão e era aclamada pelo público e pelos críticos que a consagrou como a maior cantora de jazz da história, recebendo o título de primeira-dama do jazz.

A biografia da Srta. Fitzgerald é uma deliciosa leitura que o leitor arguto não só aprende sobre a vida profissional da diva, mas os contextos culturais, econômicos e sociais de uma época do século XX. Por exemplo, Stuart Nicholson mostra o racismo nos EUA contra os negros, inclusive alguns sofridos por Ella; uma vez no trem indo fazer um show em outra cidade onde foi quase retirada da ala reservada aos brancos, pois não tinha espaço na ala dos negros; outro foi num vôo para Austrália quando Ella e sua banda foram retirados para darem seus lugares a brancos e a turnê foi cancelada.

Norman Granz foi um homem de visão; um magnata do jazz que empresariava muitos artistas daquela época, inclusive Duke Ellington. Quando viu que não havia como investir em Billi Holiday, pois esta estava recruza por vicio em drogas, foi em Ella Fitzgerald que ele viu uma mulher para mostrar ao mundo e ganhar dinheiro, através de uma série de songbooks da cantora, já popular nos EUA, que a fez pisar nos mais importantes palcos do mundo. Norman também teve mérito ao exigir, nos contratos para apresentação de Ella, que não houvesse segregação racial em espaços reservados a negros e brancos, e lutou por essa bandeira do anti-racismo no EUA.

De fato, Stuart mostra que Granz via em Ella uma mina de ouro, e foi isso que aconteceu. Ella era um poço fundo de magnitude artística e tesouro raro. Os dois ficaram multimilionários. O que também é fato é que Ella nunca teve autonomia para escolher suas musicas, gravara o que Granz queria, mas sua gana em ser sempre aplaudida pelo publico, deixava Ella apenas com sede de ovação e nunca se importou com o que gravou; muitos a acusaram de ter sido uma cantora comercial.

A biografia de Ella Fitzgerald é um bom livro para quem quer entender sobre jazz, inclusive sobre sua historia; é uma biografia musical e não pessoal da cantora, mostrando sua trajetória no jazz dentro da trajetória do próprio jazz.

Sobre a relação de Ella com a bossa nova Stuart não fez questão de aprofundar, dedicou apenas um parágrafo curto sobre o The Antonio Carlos Jobim Songbook (Ella abraça Jobim). Há também uma citação que informa que, afastada por problemas de saúde, Ella estudou português para aprimorar seu conhecimento com a música brasileira.

Foram mais de meio século de carreira e mesmo com sua saúde extremamente fragilizada, em decorrência da diabetes e pela idade avançada, Ella seguiu com turnês em viagens exaustivas, embora desaconselhada pelo seu médico. Para os amigos mais íntimos, e poucos conheceram sua intimidade, pois era obtusa, ela era uma mulher alegre e parecia sempre uma garotinha com sua perfeição musical que tinha sede de subir ao palco e ver o público a aplaudindo.

Nos anos 90, era já era considerada uma lenda viva e não faltou homenagens, menções honrosas, prêmios e prédio de universidade com seu nome, pesquisadores musicais que estudaram sua carreira, filmes, documentários e prêmios e mais prêmios de uma das mais aclamadas cantoras da história. Sua casa não cabia mais tantos prêmios. Ella foi uma das poucas pessoas a gozar da glória por tanto tempo.

O livro acaba sem mais nem menos; quando se vira a pagina, acabou. Parece ter escrito pouco antes de sua morte, pois não fala do assunto, mas se foi escrito quando Ella ainda em vida, é estranho que não se tenha nenhum depoimento da cantora.

As primeiras páginas do primeiro capítulo e as últimas dos ultimo capítulo são praticamente iguais, com o biografo fazendo uma exaltação poética da cantora, mas Stuart apenas cai na contradição quando no primeiro capítulo afirma sobre Ella: “o timbre perpetuamente jovem de sua voz falava de otimismo, de emoções descomplicadas, acima de tudo cantava num ritmo compulsivo e instigante”, mas nos últimos capítulos Stuart se refere da mesma voz:” a voz de Ella agora estava ficando mais sombria sem a suavidade natural do passado” e ainda num concerto em Montreux em 1975 Stuart diz:” revelou mais uma vez o declínio da voz de Ella, fica claro que sua voz já não era o instrumento aerodinâmico que havia sido antes, tem um vibrato quase apavorante”, mas contradições à parte, a biografia da Srta. Fitzgerald é uma leitura agradável e instigante, como Ella sempre fora, para os amásios das histórias mais fascinantes da música universal.

Ella Fitzgerald, uma biografia da primeira-dama do jazz, foi lançada no Brasil pela José Olympio Editora.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

A leitura para frustrados e fracassados

A fragilidade no sistema educacional atrelada a uma sociedade de consumo excessivo, onde a tecnologia de informação invade o cotidiano das pessoas, demonstra o baixo índice de leitura dos brasileiros e mesmo o que lêem, geralmente, está simplesmente consumindo o que o mercado impõe, o beste seler, o que todo mundo está lendo e que logo virará um longa-metragem

Nessa perspectiva, o mercado editorial encontrou uma formula mágica para minimizar suas perdas financeiras dos últimos anos. Devido à vida agitada de uma sociedade complexa, que as pessoas estão cada vez mais individualistas, os livros de auto-ajuda surgem como milagre, onde criaturas frustradas e infelizes vêem na forma fácil, simples e barata o método mais rápido para superar seus fracassos pessoais e profissionais.

Sob a égide do corporativismo capitalista, esse mercado vem fazendo da “literatura” apenas um produto comercial, onde a “arte” é simplesmente trocada pelos lucros, onde as produções intelectuais estão a favor de grandes empresas que vêem nesse caminho um paraíso de dinheiro.

Os livros de auto-ajuda é um método tão simples quanto ineficaz de procurar soluções instantâneas para problemas às vezes inexistentes, ou para tentar resolver problemas complexos que requer ajuda de um profissional e individual; esses livros por vezes, parecem ter a pretensão de diagnosticar, tratar e curar os problemas alheios, numa espécie de auto-consulta, auto-diagnóstico e auto-tratamento.

Nos últimos anos o aumento desse gênero cresceu de forma acelerada revelando a falta de rumo e sentido que as pessoas têm em dar em suas insípidas vidas.

A vida corrida, onde tudo tem que ser rápido e prático, que tempo é dinheiro, as pessoas vão a busca imediata para sua vida cada vez mais em colapso e caos. O mundo pós-moderno de pura ilusão e mentiras, de valores deturpados onde a vida pelo consumo exacerbado e imediatismo prepondera, que o entretenimento é mais valorizado que o conhecimento, é natural que existam pessoas cada vez mais ávidas para solucionar seus problemas deixando de lado problemas sociais em busca de soluções emergentes individuais.

Os livros desse gênero são considerados de literatura fútil onde os autores cada vez mais ganham dinheiro escrevendo como se as pessoas e seus problemas fossem todos iguais, com se o mundo fosse a fábrica da Mattel que vivessem bonecos em series, onde todos fossem iguais e eles fabricam o manual de instrução para quando esse derem um piff e reativado ao seu pleno estado normal. Normal?

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Carmen Costa e a mulher contemporânea


Qual posicionamento uma cantora dos anos 40, em plena era de ouro do rádio, poderia adotar ao falar da mulher de sua época? Se observarmos Alaíde Costa vemos um paradoxo com Carmen Costa, pois Carmen parecia cantar a rebeldia da tradicional mulher dona de casa que representava na época. O que se mostra mais estranho é que Carmen Costa foi uma empregada doméstica, cujo próprio patrão levou-a para o mundo da música. Então o que poderia cantar uma ex-empregada doméstica dos anos 40? A proclamação da mulher frente à sociedade de cultura machista? Sim! Carmen Costa personificava uma militante do movimento feminista na música e representava uma mulher livre da cultura dominante que reprimia o desejo da mulher. Carmen foi ousada, mostrou a mulher detentora do poder, escolhedora da paixão, da mulher que manda o homem embora, que não aceita mais ser a submissa. A mulher que Carmen representava não admitia mais os moldes, os arquétipos, os clichês. Foi talvez sua rebeldia, frente a uma sociedade hipócrita, que abriu os caminhos para outras formas de expressão de ruptura de um padrão cultural; talvez Carmen plantou uma causa para mais tarde Rita Lee escandalizar sua músicas repletas de orgia e Leila Diniz, na audácia de uma mulher contemporânea, violada pelo mundo machista.

Pensar nas canções de Carmen Costa no sentido político da mulher emancipadora, pode soar estranho, afinal não é mulher que obedece ao homem quando diz “rala a chana no chão”, ou quando ela mesma fala que “Dako é bom” , ou seja, o que poderia significar então as músicas de sua época? O que deve se observar é o contexto de uma época onde a mulher tinha acabado de ganhar o direito de votar e ainda seria proibida de ir à praia de biquíni, da mulher sem espaço no mercado de trabalho e que a ela apenas caberia ser dona de casa, cuidar dos filhos e esperar seu marido. Neste caso Carmen parece já ter rompido com isso, pois já trabalhava na rua com doméstica, por razões mesmo que desconhecidas. Então o que significa uma mulher cantar nos anos 40 “Ele é casado e eu sou a outra na vida dele, que vive igual uma brasa [...] quem me condena como se condena uma mulher perdida só me ver na vida dele, mas não o ver na minha vida [...] mas tenho muita mais lata do quem não soube prender o marido, ou ainda: Não volte a bater em minha porta, outra vez, não faça o papel tão triste que você fez, se é que ainda tem sentimento e pudor, você para mim já morreu não fique no meu caminho, que me critica não sabe a historia real se baseia falsamente em manchetes do jornal, e para entendermos ainda mais o sentido contextualizado Carmen canta: "o homem sacode a lapela e ta tudo bem, a poeira cai. A mulher quando perde a linha pode lavar que mancha não sai, pode lavar que mancha não sai, sacode a poeira, mulher quando presa seu nome, não dar o que tem sempre a cabeça erguida, sabe o terreno que ela deve pisar". Carmen utiliza de sua música para politizar-se e politizar a mulher de sua época, rompendo padrões para emancipação da mulher livre e igual ao homem, afinal Carmem é precursora neste processo da luta da igualdade de gênero e utilizou da música para seu instrumento político.