sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

O luxo e a luxúria de Rita Lee

“Mulher bem trepada” é assim que ela mesma costuma se definir. Mas já era de se esperar uma mulher sexualmente satisfeita quando observamos que as letras de duas músicas são volupioluxuriosa, mas sempre com requinte poético de alguém que não ver mal em falar na maravilha que é o sexo, aliás, nenhum mal hoje, no século vinte e um, mas quando se falava nisso há quarenta anos era outra história.

Ela é paulista, mas também ousada, no sentido literal da palavra. Ora, uma mulher cantando rock, falando de sexo, tocando guitarra não era coisa para mulher, quando se pensa que esse universo era masculinamente dominado. Mas contrariando os padrões culturais da época, Rita Lee disse: “Não nasci para casar e lavar cuecas!”. Se Rita Lee não nasceu para ser dona de casa ela nasceu para ser revolucionaria, pelo menos no que tange aos padrões femininos de uma época.

Sexo. Quando analisamos as músicas de Rita Lee o que mais ouvimos é a temática sexo. Se alguns afirmam que as musicas atuais, como o pagode e o funk carioca, não “prestam”, pois falam de sexo, então o que dizer da música de Rita Lee? Parece que a ruiva considerada a “titia do Rock brasileiro” tem hormônios permanentemente a flor da pela, na ponta da caneta e da língua. Então, a única conclusão que podemos tomar é pensar que a questão não é falar de sexo, mas como falar de sexo e Rita mostra competência quando poetiza um prática tão natural que é o sexo.

Rita parece incorporar o espírito de alguma deusa grega, ou ninfeta, quando discorre de forma livre, natural e bela o sexo e a sexualidade humana, assim como a mitologia da Grécia antiga; talvez Afrodite, a deusa do amor, do sexo e da beleza corporal, afinal na musica Banheira de Espuma ao qual convida alguém de corpo caliente para fazer massagem e relaxar a atenção em plena vagabundagem e no refrão diz: lá no reino de Afrodite, o amor passa dos limites, que quiser que se habilite o que não falta é apetite. Já na música Pega Rapaz Rita parece convidar alguém para umas das mais conhecidas posições sexuais: Pega rapaz, me pega rapaz, de frente de trás cada vez mais [...], tem tudo a ver o ser xaxim com minha trepadeira. Ora, se isso não se refere ao sexo, o que mais poderia nos remeter?

A mais célebre canção de Rita Lee, Mania de Você, parece uma canção de pós-sexo: Mania de você de tanto a gente se beijar, de tanto imaginar loucuras. Agente faz amor por telepatia[..] nada melhor do que não fazer nada, só pra deitar e rolar com você. Em Lança perfume Rita é mais clara: Eu sou neném só sossego com beijinho, ver se me dar o prazer de ter prazer comigo. Me gira de ponta à cabeça, me faz de gato e sapato, me deixa de quatro no ato, me enche de amor , nesta música Rita consegue a louvável perfeição de fazer uma metáfora poética da penetração peniana. Na música Bwama Rita afirma: te satisfazer é o meu prazer[...] e não tem culpa da boemia, volúpia[...] faço tudo por amor e os meus órgãos mais quentes lhe esperam. Mas é com Você na Mira que Rita é explicita: Quando eu nasci, minha mãe me dizia: tome com cuidado com o bicho-papão[...] o bicho papão virou me namorado[...] e brinca com a mãe dizendo na mesma música: brincar de médico é melhor que boneca e examina entre as pernas.

Ouvindo essa músicas talvez não percebamos da temática, quando nos deparamos com as atuais músicas, mas Rita tece a proeza de fazer do sexo, como temática da MPB, pioneira como ela foi, sem num tom lírico, poético. Rita consegue nos mostrar a beleza ao falar do sexo, mesmo quando sua voz parece de uma mulher no pré-orgasmo como em algumas músicas, como Eu e meu gato, onde Rita chega a gemer como se estivesse transando com o gato. A música é do Álbum Mania de você, de 1979, onde quase todas as músicas envolviam, mesmo de forma tímida, a temática sexo.

Sobre este disco o cantor Tom Zé explica que: Ele foi responsável pela educação sexual daquela época, com suas letras sexo-pedagógicas criando pelo fato de Rita ter encontrado um marido fantástico como o Roberto de Carvalho. Nunca vi uma pessoa se apaixonar tanto pelo pau de um namorado a ponto de tecer loas constantes e repetidas em tudo que cantava. No futuro, as moças podiam até reivindicar um pau como o que ela (Rita Lee) teve. Se Tom Zé exagerou ou não, o fato é que a titia do rock brasileiro é uma ninfeta na arte de compor, se em determinada musica ela diz não querer luxo nem lixo, parece que ela abre mão das duas para aderir à luxúria, sempre com maestria da poetiza erótica da musica brasileira.




quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A benção de Xangô a um ateu

Quem passa pela frente logo percebe que se trata uma casa de Axé, ou, para os ignorantes e intolerantes, casa de macumba ou do diabo. Em cima do muro branco, pequenos vasos de barro; uma palha seca de dendê no portão de entrada são símbolos de um terreiro de Candomblé.
Luana karinani, uma filha de santo regida por Nanã, a Orixá mais velha da mitologia africana, também conhecida como vovó, foi quem me levou ao Terreiro Manso Neto de Laje Grande, localizado em Lauro de Freitas. Logo perguntei a Karinani o motivo desse nome tão extenso para o terreiro e ela não soube me responder, pois se tratava de fundamento da religião. Fundamento. Essa era sempre a palavra que ouvi muito quando minha instigante curiosidade resolvia indagar sobre os elementos do terreiro. Fundamento, segundo karinani, é a doutrina da religião que é extremamente restrita aos seus membros. Disse-me que nem todos os membros do Candomblé sabem todo o fundamento da religião. “Parece ser algo determinado pelos deuses” disse. Assim, pensei que se tratava mais de uma seita que uma religião.
Logo fui apresentado ao Pai de Santo da casa, o Babalorixá Manuel, homem muito solícito e diligente, mas apenas quando minhas perguntas não eram inconvenientes. Pai Manuel, que é regido por Xangô, me mostrou seu terreiro que não era muito grande. Por toda a parede do ambiente existiam palhas secas de dendê penduradas horizontalmente na parte superior dos muros e paredes. Essa palha é chamada de Mariú que, segundo Pai Manuel, protege a roça dos maus espíritos, dos egús, que são espíritos malevolentes, espíritos de mortos que perturbam os mortais.
No meio do barracão, onde acontecem os rituais litúrgicos, estava pendurado um prato de barro. Pai Manuel me disse que havia naquele prato coco e milho, comida de Oxossi, Orixá que habita as matas e florestas.
Enquanto Pai Manuel estava afastado, pois falava no celular, eu e Karinani andávamos pelo terreiro. Conheço-a de longas datas, pois outrora me levara em outro terreiro para eu fazer um trabalho sobre antropologia simbólica.
Defrontei-me com uma minúscula casa com muitas bonecas plásticas, dessas que crianças brincam quando ainda na ingenuidade passageira que é a infância. Karinani me disse que era a casa da Erea, a Orixá criança. Achei isso interessantíssimo. Logo ao lado da casa de boneca da Erea, uma escultura de ferro estava assentada no chão, cujo tinha chifres e um tridente na mão; era o Exu...Karinani mostrou-me um objeto de ferro parecido com um arco e flecha, era o Ofá, ferramenta de guerra de Logum Edé.
Pai Manuel voltou após longa conversa nesses aparatos tecnológicos portáteis para comunicação, que em certos momentos é melhor esquecê-lo, e me disse que iria se arrumar, pois a festa para Xangô já estava para começar. Uma hora depois os atabaques tocavam. As pessoas chegavam e se achegavam em tamboretes dentro do barracão. De dentro via que quem passava na rua olhava para dentro e se benzia; uma mulher que passava com duas crianças picou uma tapa nas costelas do moleque curioso que se atreveu a olhar para dentro do barracão. (‘ Método pedagógico’ muito eficaz para o intolerantismo.)
Enquanto os atabaques tocavam naquela ambiência de espiritualidade, as mulheres dançavam em movimentos em que levemente desciam e subiam, onde seus membros superiores pouco inclinados iam para frente e para trás e seus braços dobrados faziam o mesmo movimento. Quem tocava os atabaques eram os Ogans. Lúcio, um estudante de História, é um Ogan, ele me contou que os Ogans têm, além de outras, a incumbência de tocar os instrumentos nos rituais, pois não são rodantes, não são incorporados por deuses, assim como as Ekedes, as mulheres não rodantes, que não recebem entidades, mas não podem tocar nenhum instrumento; elas auxiliam na produção da festa, podem também cantar e bater palmas, mas nunca tocar o atabaque, por motivos, claro, de fundamento.
Pai Manuel chegou todo de branco, numa vestimenta que lembrava os reis africanos. Sua mão carregava um grande prato de barro chamado de Agdá, cujo dentro tinha quiabo, dendê e camarão a comida de Xangô, chamada de Amalá. Logo me lembrei de uma música de Mariana Aydar cujo refrão é: “pra Xangô tem, tem Amalá”. O acepipe de Xangô foi colocado pelo Pai Manuel próximo ao portão de entrada do terreiro; optei não perguntar nada a respeito, pois já sabia a resposta monossilábica. Então melhor mesmo foi ouvir os atabaques que soavam naquele ambiente que faziam mulheres dançarem cantando a história mitológica da África e incorporando seus deuses, numa liturgia que envolvia arte e espiritualidade, beleza e mistério. Depois de deliciar-me com as iguarias, quitutes e guloseimas da festa, admirado com a dança, a música transcendental oriunda das riquezas e manifestações da África, fui embora coma benção de Xangô, que usou o corpo de Pai Manuel para me dizer: “cuidado no caminho e nas encruzilhadas”, imediatamente me lembrei de uma música de Vinicius de Morais que dizia” amigo, senhor, sarava! Xangô quem mandou lhe dizer: se é canto de Osanha não vá, pois muito vai se arrepender” . Assim, vos disse que se em meu caminho ele estiver, estarei seguro, e partir. (Espero que ele não saiba que eu sou Ateu!)

Vangurada Paulista: movimento rompe padrão estético de um época

Depois do movimento bossa nova nos anos 50, a Tropicália foi um dos movimentos culturais juvenil de maior notoriedade no campo intelectual e que ainda hoje, seus principais representantes têm seus espaços e são muito bem lembrados. Ainda em São Paulo, como centro de surgimentos de várias linguagens artísticas de vanguarda, em plena a expansão urbana e industrial, no final da década de 70, surge um movimento cultural que embora sempre estivesse às margens da mídia, consegue se conceituar entre críticos e especialistas, e principalmente entre o público universitário urbano, assim como na Tropicália. O movimento cultural Vanguarda Paulista surge no momento em que a indústria fonográfica se solidifica no Brasil com os gêneros “MPB” e no inicio do rock Brasil dos anos 80. Considerado o primeiro movimento cultural alternativo e independente no Brasil utilizava uma linguagem de música urbana concreta, partindo de uma nova estética artística. O movimento reunia artista, entre músicos e poetas, no Teatro Lira Paulistana, na rua Teodoro Sampaio, no bairro de Pinheiros. A música era um experimento entre funk, rock, blues, jazz e samba numa tentativa de renovar a música popular jovem, a primeira depois do Tropicalismo, ainda em São Paulo. Caracterizado como movimento Underground, a vanguarda paulista nunca ganhou espaço na grande mídia, embora sempre tenha sido elogiado pela critica especializada. Um movimento sólido, porém marginal, nunca virou produto na indústria cultural e ainda hoje, seus representantes nunca tiveram notoriedade nos espaços midiáticos, por se tratar de uma linguagem nova e uma diversidade de experimentos nos elementos sonoros. O predomínio da fala nas canções, o humor irônico e sarcástico característica de alguns grupos desta fase marcante da musica de vanguarda brasileira.
Itamar Assumpção e Arrigo Barnabé inauguraram o movimento sendo os mais influentes. O disco Claro Crocodilo (1980), de Arrigo Barnabé, é considerado o abre-alas do movimento, mas é seu segundo álbum, Tubarões Voadores, que é eleito pela revista francesa de jazz, jazz hot, um dos melhores discos do mundo. Itamar acompanhou Arrigo na banda Sabor de Veneno, em Londrina, onde já experimentava elementos do rock, samba e o funk, mas logo trilhando caminho independente ao lado da banda Isca de Policia. Músico e poeta, sempre esteve longe dos holofotes, pois recusava editar suas musicas para entrar no que chamava de “sistema”. O movimento posteriormente foi trazendo outros artistas de várias linguagens e estéticas, como a poetisa Alice Ruiz, as cantoras Tetê Espindola e Ná Ozzeti além de Luis Tatit e o grupo Rumo.

A poetisa da vanguarda

Como todo movimento cultural envolve diversas linguagens, a poesia não poderia deixar de integrá-la. Foi assim com Vinicius de Morais na Bossa Nova e Waly Salomão e Capinam na Tropicália. A poetiza Alice Ruiz se representa o a vanguarda paulista trazida pelo parceiro Itamar Assumpção ao qual tem diversas composições. Começou escrevendo contos aos 9 anos e versos aos dezesseis. Compõe letras desde os 26, tem mais de 50 músicas gravadas por parceiros e interpretes e lançou em 2005 seu primeiro disco, Paralelas, em parceria com Alzira Espindola.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Juliana Ribeiro lança primeiro disco

Depois de nove anos de carreira a cantora baiana Juliana Ribeiro lança seu primeiro disco em formato EP, que suporta apenas 35 minutos de audio. O disco é fruto de suas pesquisas sobre as origens do samba e seus diversos gêneros como o lundu, o jongo, o batuque , o vissungo. O album homonimo de Juliana Ribeiro mostra a trajetória da música popular produzida pelos negros no Brasil nos últimos três séculos.
Clemetina de Jesus, essa mestra da cultura e da música popular, é homenageada por Juliana, mas há ainda espaço para reverenciar Carmem Miranda.
Juliana Ribeiro, que é formada em música e mestranda em comunicação e sociedade pela UFBA, está todo domingo do mês de agosto , às 17 horas, no Teatro Gamboa Nova, com ingresso único e popular de R$ 5.00

sábado, 27 de junho de 2009

A importância do jornalismo acadêmico

Nos últimos meses um alvoroço, em debate no campo jornalístico brasileiro, foi intenso e as observações foram para o Supremo Tribunal Federal que tinha duas grandes decisões: sobre a lei de imprensa e a obrigatoriedade do diploma para exercício da profissão de jornalista. Sobre a última, há alguns dias o STF decidiu, por oito votos a um, que a obrigatoriedade do diploma é inconstitucional, pois o direito de liberdade de expressão é de todos e não apenas de quem tem diploma, ou seja, não é preciso necessariamente que alguém tenha um diploma para exercer o jornalismo.
Mas o fato de se exigir até agora o diploma, não impediu ninguém de manifestar sua opinião; se pensarmos no campo dos veículos de comunicação, embora saibamos de seus perfis, existem espaços reservados a opinião do leitor e para artigos de opinião que são escritos não necessariamente por jornalistas diplomados. Se pesarmos, também, que o diploma exigido para ser jornalista anula ou restringe a liberdade de todos se expressarem, é o mesmo que inferir que o trabalho do jornalista é apenas emitir opinião e/ou colocar em prática seu direito de expressão, o que precipuamente não é, embora saibamos das características da ideologia na imprensa brasileira. O jornalista não um mero emissor de opinião e/ou manifestante de suas expressões, o jornalista é um profissional capacitado para se comunicar com a sociedade, utilizando dos domínios teóricos e técnicos das linguagens jornalísticas.

Outro ponto importante alegado pelos ministros que votaram a favor da extinção do diploma, é que o exercício do jornalismo é mais intelectual que técnico e mesmo sem essa técnica (para esses ministros quase inexistentes) não colocaria em risco a sociedade, como um médico ou engenheiro que se não souber das técnicas mínimas para exercer suas respectivas profissões, poderiam causar sérios danos a sociedade. Isso não é verdade! Acredito que o exercício intelectual é importantíssimo para a prática de qualquer profissão, mas é ainda mais primordial no campo do jornalismo, afinal grandes escritores trabalharam como jornalistas e sem diploma como Machado de Assim, José de Alencar, Graciliano Ramos, Antonio Conselheiro, todavia a prática do jornalismo exige técnicas, e sem as técnicas o jornalismo poderia contaminar a sociedade com informações equívocas, deturpadas. O que será que estudantes de jornalismo fazem quatro anos na faculdade? Ficam aprendendo a serem intelectuais? Não! Aliás, deveria ser também, mas cada meio de comunicação exige uma técnica diferente, o jornalista deve entender cada linguagem, dominar o processo de comunicação para obter êxito. Essas técnicas são ensinadas na academia para que o profissional formando tenha conhecimentos dessas técnicas, para aplicá-las no exercício de sua profissão. O jornalismo não é uma arte, é uma ciência e, como toda ciência, tem seus corpos empíricos, suas teorias, seus objetos de investigações.

Não é qualquer pessoa, por mais intelectual que seja, que poderia escrever uma reportagem para um jornal, dentro dos parâmetros da linguagem jornalística, quanto ao lide, a busca e adequação da fonte, apuração precisa e contextualizada do fato. Também, por mais intelectual que alguém seja, seria difícil fazer um texto em linguagem radiofônica ou ir para uma assessoria de imprensa sem dominar as técnicas de cada canal. Portanto, acredito que a profissão de jornalista é essencial para a manutenção de uma sociedade livre e com direito de saber o que acontece no meio de forma clara, objetiva e verídica garantido a todos o direito a informação. Mas é necessário técnicas para exercer essa profissão, as técnicas se aprendem na academia. O exercício do jornalismo é uma atividade intelectual, mas exige técnica; é necessária uma congruência das duas, senão teremos o risco de termos uma sociedade a mercê das informações inverídicas e levianas. Se alguém pensa que não há danos a sociedade, um jornalismo sem parâmetros de técnicas e ética, o que poderia acontecer em um país cuja imprensa usurpa a opinião publica, onde foi e é capaz de conspirar para manutenção de regimes antidemocráticos, se é capaz de decidir a agenda do debate nacional, intrigar, comover e provocar escândalos no país, utilizar do seu” Quarto Poder” para manter uma ideologia dominante nas mãos de uma elite fracassada, então, que abolam o diploma para ver no que dar, mas eu não quero pagar pra ver, ouvir nem ler.

domingo, 21 de junho de 2009

Democracia à arte no Gamboa Nova

Desde 1974 o Teatro Gamboa Nova abre suas portas para o público e as cortinas para a arte. Mesmo de forma intermitente, a Gamboa é um centro cultural onde arte é democratizada, coisa que precisamos : o acesso aos bens culturais artísticos. O minúsculo e aconchegante teatro é um ambiente tão pequeno quanto confortável; com dois espaços para platéia, inferior e superior. Com cadeiras de vime e forrada com pano vermelho, assim como as cortinas, o que dar uma sensação de familiaridade pela proximidade entre público e palco; parece até uma casinha de boceca.

O Gamboa Nova se destaca pelos bons espetáculos de música, teatro, dança e exposições gerais. O preço simbólico de cinco reais (preço único) é para levar todos a conhecer o mundo mágico das artes. De quinta à domingo tem espetáculo; pela semana o espetáculo é musical, sempre às 20 horas e com o mesmo valor de cinco reais, além de contar, também, com teatro infantil que é sempre às 17 horas, mas esse sempre sábados e domingos.

Ontem fui à primeira vez ao Teatro Gamboa Nova e fiquei encantado pelo local. O espetáculo foi Quem tem medo de D. Margarida? Um monólogo com a atriz Cecília Moura. D. Margarida é uma professora no primeiro dia de aula (a classe é a platéia) do quinto ano ginasial. Com métodos autoritários, a professora é uma mulher desequilibrada que ensina que forma muito estranha biologia, história, português e matemática. Segundo D. Margarida, seu método pedagógico é uma salvação para a humanidade. O espetáculo é muito interativo e humorado e a atriz Cecília Moura é uma proeza na arte da interpretação.

O Tetro Gamboa Nova Fica na Rua Gamboa de Cima, Aflitos, próximo ao Campo Grande, atrás do Teatro Vila Velha. Para ver a programação da semana acesse: http://www.teatrogamboanova.com.br/

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Lenda do jazz: a biografia de Ella Fitzgerald

Ella Fitzgerald foi uma cantora que conseguiu a glória e a ovação nos palcos do mundo em quase sete décadas de carreira e Stuart Nicholson, seu biógrafo, nos conta como foi essa trajetória de uma das mais belas e conhecidas vozes do jazz e da música popular do século XX.

Ella Fitzgerald, uma biografia da primeira-dama do jazz, não é uma biografia para fã saber sobre toda vida pessoal de uma artista; apenas o primeiro capítulo mostra um pouco de sua infância e onde vivera, afinal Ella escondia a sete chaves seu passado e Stuart Nicholson, teve a indelicadeza de supor que ela foi abusada pelo seu padrasto na infância e que fez um aborto quando jovem a impendido de gestar, adotando uma criança mais tarde.

Ella nasceu na Virginia, EUA, em 1917. Negra e de família pobre, ficou órfã muito cedo e acabou nas ruas. Seu maior sonho era conquistar o palco pela dança, mas foi à música que lhe tirou das ruas para qualquer lugar onde seus sonhos mais ambiciosos pudesse lhe proporcionar, inclusive à Dinamarca, onde morou por um ano.

Por ser negra e moradora de rua, teve dificuldades em participar de programas de calouros, sendo até impedida de receber um prêmio de primeiro lugar em uma boate, pois a considerava feia [sic]. Logo ingressou na banda de Chick Webb, mesmo Webb resistindo que Ella entrasse na banda devido a sua aparência não convencional, mas ela levou a banda ao estrelato em 1938, dois anos depois de ter ingressado, nos tempos do jazz swing, quando jazz era música para dançar e para as massas e Webb, que sonhava com o estrelato viu em Ella o caminho de sua gloria por poucos meses, pois morrera em 1939.

Com Dizzy Gillespie, pai do jazz be bop, excursionou com sua banda na nova vertente do jazz, que agora das boates das periferias ia para grandes clubes, salas de concertos e prestigiadas casas noturnas dos EUA. Ella transitou do swing para o be bop com êxito e já nos anos 50 era uma cantora mundialmente conhecida; cantava para platéias do EUA, Europa e Japão e era aclamada pelo público e pelos críticos que a consagrou como a maior cantora de jazz da história, recebendo o título de primeira-dama do jazz.

A biografia da Srta. Fitzgerald é uma deliciosa leitura que o leitor arguto não só aprende sobre a vida profissional da diva, mas os contextos culturais, econômicos e sociais de uma época do século XX. Por exemplo, Stuart Nicholson mostra o racismo nos EUA contra os negros, inclusive alguns sofridos por Ella; uma vez no trem indo fazer um show em outra cidade onde foi quase retirada da ala reservada aos brancos, pois não tinha espaço na ala dos negros; outro foi num vôo para Austrália quando Ella e sua banda foram retirados para darem seus lugares a brancos e a turnê foi cancelada.

Norman Granz foi um homem de visão; um magnata do jazz que empresariava muitos artistas daquela época, inclusive Duke Ellington. Quando viu que não havia como investir em Billi Holiday, pois esta estava recruza por vicio em drogas, foi em Ella Fitzgerald que ele viu uma mulher para mostrar ao mundo e ganhar dinheiro, através de uma série de songbooks da cantora, já popular nos EUA, que a fez pisar nos mais importantes palcos do mundo. Norman também teve mérito ao exigir, nos contratos para apresentação de Ella, que não houvesse segregação racial em espaços reservados a negros e brancos, e lutou por essa bandeira do anti-racismo no EUA.

De fato, Stuart mostra que Granz via em Ella uma mina de ouro, e foi isso que aconteceu. Ella era um poço fundo de magnitude artística e tesouro raro. Os dois ficaram multimilionários. O que também é fato é que Ella nunca teve autonomia para escolher suas musicas, gravara o que Granz queria, mas sua gana em ser sempre aplaudida pelo publico, deixava Ella apenas com sede de ovação e nunca se importou com o que gravou; muitos a acusaram de ter sido uma cantora comercial.

A biografia de Ella Fitzgerald é um bom livro para quem quer entender sobre jazz, inclusive sobre sua historia; é uma biografia musical e não pessoal da cantora, mostrando sua trajetória no jazz dentro da trajetória do próprio jazz.

Sobre a relação de Ella com a bossa nova Stuart não fez questão de aprofundar, dedicou apenas um parágrafo curto sobre o The Antonio Carlos Jobim Songbook (Ella abraça Jobim). Há também uma citação que informa que, afastada por problemas de saúde, Ella estudou português para aprimorar seu conhecimento com a música brasileira.

Foram mais de meio século de carreira e mesmo com sua saúde extremamente fragilizada, em decorrência da diabetes e pela idade avançada, Ella seguiu com turnês em viagens exaustivas, embora desaconselhada pelo seu médico. Para os amigos mais íntimos, e poucos conheceram sua intimidade, pois era obtusa, ela era uma mulher alegre e parecia sempre uma garotinha com sua perfeição musical que tinha sede de subir ao palco e ver o público a aplaudindo.

Nos anos 90, era já era considerada uma lenda viva e não faltou homenagens, menções honrosas, prêmios e prédio de universidade com seu nome, pesquisadores musicais que estudaram sua carreira, filmes, documentários e prêmios e mais prêmios de uma das mais aclamadas cantoras da história. Sua casa não cabia mais tantos prêmios. Ella foi uma das poucas pessoas a gozar da glória por tanto tempo.

O livro acaba sem mais nem menos; quando se vira a pagina, acabou. Parece ter escrito pouco antes de sua morte, pois não fala do assunto, mas se foi escrito quando Ella ainda em vida, é estranho que não se tenha nenhum depoimento da cantora.

As primeiras páginas do primeiro capítulo e as últimas dos ultimo capítulo são praticamente iguais, com o biografo fazendo uma exaltação poética da cantora, mas Stuart apenas cai na contradição quando no primeiro capítulo afirma sobre Ella: “o timbre perpetuamente jovem de sua voz falava de otimismo, de emoções descomplicadas, acima de tudo cantava num ritmo compulsivo e instigante”, mas nos últimos capítulos Stuart se refere da mesma voz:” a voz de Ella agora estava ficando mais sombria sem a suavidade natural do passado” e ainda num concerto em Montreux em 1975 Stuart diz:” revelou mais uma vez o declínio da voz de Ella, fica claro que sua voz já não era o instrumento aerodinâmico que havia sido antes, tem um vibrato quase apavorante”, mas contradições à parte, a biografia da Srta. Fitzgerald é uma leitura agradável e instigante, como Ella sempre fora, para os amásios das histórias mais fascinantes da música universal.

Ella Fitzgerald, uma biografia da primeira-dama do jazz, foi lançada no Brasil pela José Olympio Editora.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

A leitura para frustrados e fracassados

A fragilidade no sistema educacional atrelada a uma sociedade de consumo excessivo, onde a tecnologia de informação invade o cotidiano das pessoas, demonstra o baixo índice de leitura dos brasileiros e mesmo o que lêem, geralmente, está simplesmente consumindo o que o mercado impõe, o beste seler, o que todo mundo está lendo e que logo virará um longa-metragem

Nessa perspectiva, o mercado editorial encontrou uma formula mágica para minimizar suas perdas financeiras dos últimos anos. Devido à vida agitada de uma sociedade complexa, que as pessoas estão cada vez mais individualistas, os livros de auto-ajuda surgem como milagre, onde criaturas frustradas e infelizes vêem na forma fácil, simples e barata o método mais rápido para superar seus fracassos pessoais e profissionais.

Sob a égide do corporativismo capitalista, esse mercado vem fazendo da “literatura” apenas um produto comercial, onde a “arte” é simplesmente trocada pelos lucros, onde as produções intelectuais estão a favor de grandes empresas que vêem nesse caminho um paraíso de dinheiro.

Os livros de auto-ajuda é um método tão simples quanto ineficaz de procurar soluções instantâneas para problemas às vezes inexistentes, ou para tentar resolver problemas complexos que requer ajuda de um profissional e individual; esses livros por vezes, parecem ter a pretensão de diagnosticar, tratar e curar os problemas alheios, numa espécie de auto-consulta, auto-diagnóstico e auto-tratamento.

Nos últimos anos o aumento desse gênero cresceu de forma acelerada revelando a falta de rumo e sentido que as pessoas têm em dar em suas insípidas vidas.

A vida corrida, onde tudo tem que ser rápido e prático, que tempo é dinheiro, as pessoas vão a busca imediata para sua vida cada vez mais em colapso e caos. O mundo pós-moderno de pura ilusão e mentiras, de valores deturpados onde a vida pelo consumo exacerbado e imediatismo prepondera, que o entretenimento é mais valorizado que o conhecimento, é natural que existam pessoas cada vez mais ávidas para solucionar seus problemas deixando de lado problemas sociais em busca de soluções emergentes individuais.

Os livros desse gênero são considerados de literatura fútil onde os autores cada vez mais ganham dinheiro escrevendo como se as pessoas e seus problemas fossem todos iguais, com se o mundo fosse a fábrica da Mattel que vivessem bonecos em series, onde todos fossem iguais e eles fabricam o manual de instrução para quando esse derem um piff e reativado ao seu pleno estado normal. Normal?

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Carmen Costa e a mulher contemporânea


Qual posicionamento uma cantora dos anos 40, em plena era de ouro do rádio, poderia adotar ao falar da mulher de sua época? Se observarmos Alaíde Costa vemos um paradoxo com Carmen Costa, pois Carmen parecia cantar a rebeldia da tradicional mulher dona de casa que representava na época. O que se mostra mais estranho é que Carmen Costa foi uma empregada doméstica, cujo próprio patrão levou-a para o mundo da música. Então o que poderia cantar uma ex-empregada doméstica dos anos 40? A proclamação da mulher frente à sociedade de cultura machista? Sim! Carmen Costa personificava uma militante do movimento feminista na música e representava uma mulher livre da cultura dominante que reprimia o desejo da mulher. Carmen foi ousada, mostrou a mulher detentora do poder, escolhedora da paixão, da mulher que manda o homem embora, que não aceita mais ser a submissa. A mulher que Carmen representava não admitia mais os moldes, os arquétipos, os clichês. Foi talvez sua rebeldia, frente a uma sociedade hipócrita, que abriu os caminhos para outras formas de expressão de ruptura de um padrão cultural; talvez Carmen plantou uma causa para mais tarde Rita Lee escandalizar sua músicas repletas de orgia e Leila Diniz, na audácia de uma mulher contemporânea, violada pelo mundo machista.

Pensar nas canções de Carmen Costa no sentido político da mulher emancipadora, pode soar estranho, afinal não é mulher que obedece ao homem quando diz “rala a chana no chão”, ou quando ela mesma fala que “Dako é bom” , ou seja, o que poderia significar então as músicas de sua época? O que deve se observar é o contexto de uma época onde a mulher tinha acabado de ganhar o direito de votar e ainda seria proibida de ir à praia de biquíni, da mulher sem espaço no mercado de trabalho e que a ela apenas caberia ser dona de casa, cuidar dos filhos e esperar seu marido. Neste caso Carmen parece já ter rompido com isso, pois já trabalhava na rua com doméstica, por razões mesmo que desconhecidas. Então o que significa uma mulher cantar nos anos 40 “Ele é casado e eu sou a outra na vida dele, que vive igual uma brasa [...] quem me condena como se condena uma mulher perdida só me ver na vida dele, mas não o ver na minha vida [...] mas tenho muita mais lata do quem não soube prender o marido, ou ainda: Não volte a bater em minha porta, outra vez, não faça o papel tão triste que você fez, se é que ainda tem sentimento e pudor, você para mim já morreu não fique no meu caminho, que me critica não sabe a historia real se baseia falsamente em manchetes do jornal, e para entendermos ainda mais o sentido contextualizado Carmen canta: "o homem sacode a lapela e ta tudo bem, a poeira cai. A mulher quando perde a linha pode lavar que mancha não sai, pode lavar que mancha não sai, sacode a poeira, mulher quando presa seu nome, não dar o que tem sempre a cabeça erguida, sabe o terreno que ela deve pisar". Carmen utiliza de sua música para politizar-se e politizar a mulher de sua época, rompendo padrões para emancipação da mulher livre e igual ao homem, afinal Carmem é precursora neste processo da luta da igualdade de gênero e utilizou da música para seu instrumento político.

domingo, 31 de maio de 2009

A reportagem tratada como ciência

A profissão do jornalista, embora não pareça, é precipuamente uma profissão de caráter social. Observar a realidade, colher e mostrar para a sociedade fatos plausíveis para discussão social de forma objetiva, consistente e contextualizada é dever de qualquer jornalista que honre a profissão. Caco Barcellos é desse jornalista; um jornalista social e científico; social, pois aborda assuntos que problematizam as relações sociais de poder, e científico porque suas reportagens têm uma abordagem extremamente profunda, investigativa, observatória e comparativa, pelo menos é o que percebi ao ler seu didático livro-reportagem Rota 66, a história da policia que mata (Ed. Globo).

Morte, como sabemos, se classifica como um critério de noticiabilidade, que cada vez mais os veículos de comunicação utilizam para fazer seus jornais-espetáculos. Todos os dias lemos nos jornais, ouvimos no rádio ou assistimos na televisão a morte do outro; o outro é o que está longe de nós, o que, forjadamente, a imprensa-burra incuti que a morte do outro não tem importância, ou melhor, ela foi melhor para a sociedade. São mortes de jovens, negros, pobres que aparecem na mídia todos os dias. “Bandido”, “assaltante”, “traficante”, “criminoso”, “pernicioso” são alguns nomes que a grande imprensa classifica esse individuo, sempre num tom de desdém, de alivio, de indiferença, mostrando o quanto a imprensa brasileira se comporta, além usurpar a opinião pública, usurpa o juiz da justiça, já sentenciando os suspeitos e indiciados. Apenas é mostrado seu nome, sua idade, sua cara e circunstância da morte. A cada dia mais um, outro dia, mais um. São jovens assassinados, apenas isso. Pouco se mostra a história dessas pessoas, suas origens, seu ambiente, seu contexto, sua educação, seus acessos aos bens mínimos que garantam ao homem o direito a cidadania, a participação social e política; o discernimento das coisas, seu ambiente cultural; nada se mostra das frustrações desses homens, das angustias vividas, das suas negações e privações. Não há espaço no jornal, não há interesse no jornal; é apenas mais um.

Caco Barcellos mostrou-se de um lado em Rota 66: o lado dos mais fracos; mostrou a versão e os fatos, mostrou a verdade. O que Caco provou é que a imprensa deixou de valer-se de fatos em detrimento de versões. A morte de um jovem a tiros em uma periferia de uma metrópole é um fato e os fatos noticiáveis devem responder as seis perguntas básicas do lead do texto jornalístico, mas quando as perguntas são respondidas oficialmente pelo Estado, que manda matar os negros nas favelas, são no mínimo esdrúxulas, que chego apenas a uma conclusão: a impressa-burra-burguesa é conivente com a ideologia mecanicista do Estado: indivíduos perniciosos a sociedade deve ser definitivamente excluídos da sociedade, pois não há recuperação; mas, pergunto eu, quem são esses indivíduos perniciosos? Os negros? Sim! É só observar a etnia dos assassinados a tiro nos jornais. È a ideologia racista que parte da premissa que o negro e naturalmente ruim, faz parte de sua essência ser ruim, é a sua natureza ser perverso, cruel, não há nenhum método que o recupere, nenhum processo de resocialização vai recuperá-lo, então o que fazemos? Matamo-los! Essa é o projeto do Estado em parceria com a imprensa: um genocídio nas periferias deste país.
Em Rota 66, a história da policia que mata Caco Barcellos, em 22 anos de pesquisa, mostra os fatos; faz da reportagem uma ciência do jornalismo.
Caco observou 3.846 pessoas mortas pela policia na periferia de São Paulo. Depois de analisar caso por caso, utilizando um jornal como fonte, a versão oficial da policia e os inquéritos na justiça e no IML, Caco prova que desses 3.846 mortos, 2.303 eram inocentes. O abuso da policia fascista nas periferias, na perseguição de inocentes, no assassinato de pessoas indefesas, que nos jornais é apenas mostrado como bandido é uma fotografia de uma verdade escondida pelo jornalismo cretino. Policias que matam e são absolvidos pela justiça, que ganham promoção na corporação; ainda mostra através desta pesquisa que os policiais campeões em assassinato, sendo que um deles ainda se elegeu deputado. Caco nos mostra a tática da policia quando assassina o inocente, suspeitos e mesmo criminosos: execução com vários tiros, inclusive muitos na cabeça. A retirada do corpo, para violar o local do crime e evitar pericia e um falso socorro para o hospital a fim de dizer que foi morto no hospital depois de trocar tiros com a policia. Um fato curioso é que essas 3.846 pessoas tinham diversas balas no corpo, muitas na cabeça e a queima-roupa. Os policias arrumavam uma arma e mostrava ao delegado que o morto utilizou na farsa de um tiroteio. Caco identificou muita destas famílias para saber a historia do assassinado e descobriu coisas que imprensa não faz questão de saber. Relatou casos dolorosos de ser lidos como a de um rapaz, que nunca teve envolvimento com crime, ser executado na frente da mãe.

Além de mostrar a história de gente morta a servido da ideologia racista, que degrada qualquer sociedade, Caco mostra de forma minuciosa como realizou a pesquisa durante mais de duas décadas, as dificuldades, as cuidado a paciência, a busca pelos familiares dos mortos, por sobreviventes, um verdadeiro manual para uma reportagem profunda e coerente com fatos.
Caco revela em Rota 66 que o jornalismo levado a serio deve ser profundo, radical e real. Em vez de esquecer o de hoje para noticiar o de amanhã: o preto, pobre assassinado, Caco quis ir além, quis saber toda a história, de todos os ângulos para mostrar que a mentira vendida como verdade na grande imprensa é o veneno do jornalismo descente. Mérito a caco Barcellos por fazer dos excluídos objeto de interesse no jornalismo serio que falta no maior parte da imprensa da elite racista brasileira.

domingo, 17 de maio de 2009

Estrela viva


Poucas cantoras conseguem passar no tempo deixando seu nome na historia da música popular brasileira, mesmo com uma carreira de altos e baixos, e quando se trata de 53 anos de carreira, é ainda mais raro, pois quem muitos que fizeram sucesso no passado hoje estão no ostracismo. Não com Alaíde Costa, que mesmo passado mais de meio século do seu primeiro LP, consegue manter uma técnica impecável com sua voz doce e inconfundível consagrada como a “dama da canção brasileira”, numa época que Elizeth Cardoso e Dolores Duran estavam no auge no sucesso. Não foi por acaso que, após ouvi-la, João Gilberto a convidou para participar das reuniões do movimento bossa nova, que ainda estava surgindo. Apenas ela e Sylvia Telles eram cantoras profissionais a participar do movimento, quando ainda tinha reuniões, lá conheceu Oscar Castro Neves, seu parceiro por muito tempo. Desde então Alaíde começa a gravar e compor músicas do movimento.

Natural do Rio de Janeiro, Alaíde Costa Silveira Mondin Gomide, como as cantoras de sua época, começou no rádio; aos 13 anos já tinha vencido o concurso de melhor cantora jovem. Em seguida passou a freqüentar programas de calouros, inclusive no programa Pescando Estrela, apresentado por Ary Barroso na rádio clube do Brasil. Com seu primeiro LP, Tarde Demais, de 1957, ganhou o prêmio de cantora revelação. Como ironia da vida, assim como Beethoven, na década de 1970, Alaíde se afasta da música por problemas de audição, felizmente reversível. Alaíde Costa já foi por muitos comparada a Billi Holiday, embora ela mesma afirme gostar mais de Sarah Vaughum. Mais de uma coisa não se pode negar: Alaíde é uma cantora de vanguarda. Além de participar do movimento bossa nova nos anos 50, participou também do movimento mineiro Clube da Esquina, gravando no mesmo disco com Milton Nascimento, que produziu, em 1976, seu disco Corações. Em 2007, comemorando 50 anos de carreira lança o disco bem sugestivo Tudo que o tempo me deixou ao lado do maestro e pianista Gilson Peranzzetta num belíssimo show de uma das mais aclamadas e coerentes cantoras brasileiras.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Língua portuguesa: unificação da ortografia une laços entre povos e culturas

A língua portuguesa comporta duas modalidades: o escrito e o falado. Nessas modalidades, as duas não têm as mesmas formas, nem a mesma gramática, tampouco os mesmos recursos expressivos. Para ampliar o espaço de comunicação entre todos os falantes da língua, várias tentativas de unificar a ortografia foram criadas desde o começo do século XX entre Brasil e Portugal. Não se pode confundir ortografia de língua; não se trata de unificar a língua portuguesa, mas apenas sua ortografia, ou seja, a modalidade escrita. Para fortalecer a língua portuguesa é necessário que haja uma forma única de se escrever, para que o alcance de comunicação entre os países lusófonos seja mais abrangente, pois acima de pequenas comunidades locais há a comunidade nacional e internacional da língua portuguesa. Portanto, faz-se necessário uma forma de comunicação escrita que sirva não só para intercâmbios entre compatriotas, como para todos aqueles que falam o português, ou para quem quer aprender, transpassando o tempo entre pessoas que vivem em lugares e épocas diferentes; uma língua escrita que vá além das fronteiras de lugar e tempo, respeitando sempre o pluralismo linguístico e as peculiaridades dos falares local, pois a língua é o principal sistema simbólico que representa uma cultura; não só expressa aspectos linguísticos, mas expressa o ambiente social e nacional. A língua expressa e identifica um povo, sua cultura e suas diversas manifestações. Quando a língua é acessível não só aos seus falantes, quando não há obstáculos técnicos e elementos que dificultem sua compreensão, ela transpassa barreiras e propaga seu povo, sua cultura e suas manifestações, a limites antes inalcançáveis. Apenas quando os indivíduos falantes de uma mesma língua expandem seus canais de comunicação, para se compreenderem e respeitarem mutuamente, através da própria língua, se autoafirmam em qualquer tempo e espaço e se posicionam como pertencentes de uma única nação.
O acordo ortográfico gerou e ainda gera muitas discussões sobre seus impactos na sociedade. Primeiro é necessário elucidar alguns pontos comuns e equivocados sobre o acordo difundido pela mídia: o acordo não unifica a língua portuguesa, apenas unifica a forma de grafar as palavras, afinal nenhum decreto poderá unificar ou reformar uma língua, pois a língua é livre, nunca permanece presa, é imutável em relação ao tempo e as diferentes regiões, com ou sem acordos. Segundo, não existe reforma na língua; são apenas ajustes na forma escrita, modificando menos de 1% das palavras. Ademais, o debate sobre o acordo se fecha apenas no círculo acadêmico onde apenas escritores, linguistas, filólogos e pesquisadores têm espaço para emitir opinião; a língua é universal e deve também levar em conta a importância e impactos para todos os falantes e não apenas aos mais “letrados”. Não podemos mais admitir que o discurso conservador de gramáticos normativos, perenize uma ideologia linguística, que despreza e estigmatiza a diversidade da língua, onde a própria língua portuguesa sempre esteve refém, principalmente no que tange ao ensino/aprendizagem. O acordo unifica a língua escrita e não a falada, por isso a importância à pluralidade dos discursos, respeitando as variedades naturais da própria língua.
A língua portuguesa é complexa, com rígidas normas gramaticais, o que dificulta seu aprendizado, mesmo aos nativos onde a língua é oficial. Sua dupla ortografia dificulta também a difusão no âmbito internacional. A língua inglesa, embora falada em muitos países, possui poucas diferenças na ortografia; a língua árabe, falada em mais de vinte países, possui uma ortografia única. Assim, é necessário unificar a ortografia da língua portuguesa para que a língua alcance maior espaço, procurando mecanismos de acesso, simplificando-a graficamente, possibilitando o conhecimento do seu povo, sua origem e suas diversas representações. A unificação de sua ortografia não une apenas sua língua escrita, une também os laços entre povos e culturas; une comunidades para fortalecimento e difusão de apenas uma: a comunidade internacional da língua portuguesa.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

"Nada é estático". Heráclito de Éfeso é considerado o mais obscuro dos pré-socráticos

Muitos consideram esse filósofo pré-socrático, Heráclito de Efêso (540 a.C.) pai da dialética, mas o pensamento de Heráclitiano é muito mais que isso, um pensamento sintético que nos leva a múltiplos desdobramentos para interpretação de seus fragmentos, ao todo 126. Assim como a maioria dos pré-socráticos, ou pensadores originários como preferem Nietzchie e Heidegger, Heráclito deixou apenas fragmentos o que não diminui sua filosofia. Sua doutrina se estrutura no Logos (leghein), na sintonia com o Logos. O Logos para Heráclito é a totalidade do existente, uma força que junta, uni todas as coisas que existem. Uma força de reunião dos contrários que de algum modo se co-relacionam. Essa reunião dos contrários seria a razão, a sintonia, a harmonia do Logos de Heráclito, considerado o primeiro pensamento sob estruturas dialéticas. Enquanto a filosofia de Tales de Mileto, considerado o primeiro filósofo, a Arché, princípio primeiro que rege o Cosmo, é a água, para Heráclito é o fogo. Todas as coisas originam e sucumbem-se do fogo. O Cosmo nasce e se consuma do fogo. O fogo esquenta, mas o que esquenta, esfria, essa é a reunião dos contrários se co-pertencendo; o frio é a outra dimensão ou fase do que era quente e o quente é a outra dimensão do que era frio; a luz só existe por causa da escuridão, assim como o som existe por causa do silêncio, essas antíteses estão o tempo todo se relacionando entre si.
Outra característica do pensamento de Heráclito de Efêso é que tudo está em movimento. Nada é estático. O principio fundamental do universo é o devir, que são contínuas transformações. As coisas estariam em perene mudança, sempre em movimento. É atribuído ao filósofo o fragmento “Ninguém entra duas vezes no mesmo rio”, pois as águas do rio nunca serão as mesmas, sempre estão em movimento, transformação e renovação, o rio é e não é o mesmo, percorre seu caminho e outras águas virão e novamente irão e o ser que entra no rio também se modifica biológica e intelectualmente, as pessoas estão em mudança, também não são estáticas, transformam-se.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Mariana Aydar Lança 2° cd de inéditas


O primeiro cd de Mariana Aydar, Kavita 1, lançado em 2006, rendeu-lhe elogios da crítica que a considerou revelação da moderna música brasileira. Com essa responsabilidade a cantora acaba de lançar seu segundo disco, Peixes, Pássaros Pessoas, pela Universal, com o mesmo perfil do primeiro: o samba na ala de frente, com espaço para o baião e jazz. São treze faixas de músicas inéditas, cuja três Mariana mostra sua vertente para compor, sob o pseudônimo Kavita, em Palavras Não Falam, Aqui em Casa e Tudo Que Eu Trago no Bolso. Segundo Mariana, que é filha de Mário Manga e da produtora musical Bia Aydar, o disco é muito autoral e autobiográfico, por isso as composições foram feitas sob encomenda a músicos selecionados a dedo, entre eles, Duani, seu namorado, que co-produziu o disco e assina sete canções e o músico Kassin, além de contar com composições de Roberta Sá e Pedro Luis. Nas parcerias vocais Mayra Andrade e Zeca Pagodinho dividem duas canções do álbum com a cantora, que mostra a maturidade em novo trabalho mais denso e sem apelos repetitivos.

domingo, 22 de março de 2009

Minúsculo e inútil tratado sobre a virtude: O reflexo e a reflexão


Não se trata apenas de mais uma crise existencialista, mas de uma investigação a cerca dos verdadeiros valores ao qual o homem tem dificuldade para o caminho da felicidade. Não é bom saber e aceitar que certos valores da sociedade contemporânea, valores estes deturpados, condicionam os entes a seguirem tais valores que tem por alicerce a irreflexão, a ideologia e os pré-conceitos fixados pela cultura, que de alguma forma torna-se comum, portanto natural.
Sou a favor de um novo olhar de tais valores que, por ora, são tão machistas quanto hipócritas.
Segundo Rousseau o ser humano é influenciado pelo meio que o determina, assim também se encontra as bases do pensamento behaviorista; acredito nesta máxima, sabendo claro, das fortes críticas por outros campos científicos e filosóficos. Acredito também que temos que parar no vago instante de reflexão (se é que temos) para fazermos e criarmos novos conceitos impostos pela cultura hegemônica branca. Quando isto acontece é sinal da própria maturidade intelectual ao qual colocar-nos em patamar elevado tão quanto a do caminho que nos levará a prazerosa atividade filosófica.
É justamente quando cada um abre seu caminho, onde a própria filosofia através do questionamento reflexivo pode nos colocar em um nível de segurança de paz e felicidade.
Quando cada ente, a partir da disposição, e outros olhares sobre seus valores sociais e pessoais, que ora podem ser idênticos e/ou equivocados, ascende-se a luz da reflexão A reflexão é quando o ente desenvolve o poder do olhar observador, para o devido afastamento do objeto e fará de forma sempre lúcida um pensar interrogatório sob tudo que o cerca. Este interrogatório é feito a si mesmo.
Vivemos em um momento de extrema confusão de valores, significados, conceitos. De um lado a ciência, do outros a teologia promovendo suas crises e próprias ilusões para apenas confundir em detrimento da iluminação.
Penso da emergência necessária de que todos possam partir de seus reais princípios para suas reflexões, e numa reflexão coletiva derrubaríamos obstáculos para a própria felicidade coletiva, pois se não há conforto para todos no meio em que vivemos não há de haver conforto individual. E, no entanto, só há conforto individual quando há conforto coletivo. A pedagogia de Paulo Freire se estrutura no olhar para o outro em detrimento de si mesmo. Quando o homem aceita o outro como objeto de sua felicidade, quando o homem perceber que sua felicidade depende da felicidade coletiva, pois senão a felicidade será travestida de medos, ilusões, isolamentos, solidão, pois o outro pode acabar com minha felicidade. Esse tipo de pensamento se evidencia na estúpida classe média falida brasileira, que enquanto não abrir mão do gozo individual para coletivizar, que enquanto não utilizar da força para explorar e roubar os mais fracos, que enquanto não souber compartilhar, dividir e apenas usar a astúcia para explorar, humilhar e dominar através de sua ideologia mesquinha e racista viverá com medo do outro; buscará caminhos e criará barreiras para se separar, se desvincular do outro. Todavia o outro está em cada esquina, aparece do lado de fora de seu mundo, ferindo sua alma; aparece pelo vidro, que embora o outro não o veja, ele ver o outro perfeitamente. “Preguiçosos”, “vagabundos”, “inúteis”, “perigosos”. Abrirão suas bocas sujas de creme de madeira sob comida requintada para dizer o que pensam, sem saber que nutrem em mentes administradas por psicanalista em consultório fino e elegante o auto-desprezo. Tem vergonha de seus peidos que fedem, não olham suas fezes que fedem, não olham suas almas podres, pois seus corpos são desinfetados com perfume francês; e suas almas, o que devem fazer? Renegá-las? E seus corpos depois de mortos, o que devem fazer para não entrar larvas e vermes pelo ânus? Queimá-las? E sua estupidez que degradam a sociedade com suas praticas subvertidas e mesquinhas, o que devem fazer? Passar para seus filhos? Os seus medos e horrores, ilusões, omissões e gargalhadas, odores, ódios e tatuagens, o que devem fazer? Estas as carregam pelo resto da vida.
Não cabe a mim estabelecer quais seriam os valores e vícios aqui, pois poderia me tornar, talvez, jactante, todavia penso da pertinência de pelo menos dizer a respeito do respeito, virtude precípua que deve ser reinterpretado de um outro olhar sobre seu significado, característica, importância e impactos. Do respeito poderíamos construir um arcabouço e elevar outros valores de patamares cada vez mais superiores como a tolerância, humanismo e equidade, embora, cada um “ache” que já sabe o que é que já tem. Quanto aos outros, façamos o mesmo.
E de praxe ouvirmos alguém dizer que é assim por que todo mundo faz assim. Mas é necessário este rompimento imediato desta correte irreflexiva e tola que se traduz apenas como um verme disseminando em carne podre. Ora, se eu ajo de tal forma por que todos agem assim contribuo para que continue desta forma e sendo espelho para o outros. Alias, acredito nesta afirmação importantíssima de que somos um espelho para o outro e quando isto entra na consciência humana e que todo agir humano segue este principio, estabeleceremos a paz perpétua. Cada um de nós somos agente de transformação, somos tanto influenciados quantos influenciadores. Isto é fato. Ninguém está agindo de certa maneira por que considera socialmente adequada, mas agem por influência do outro, pois pré-julgamos fazer com o outro aquilo que pensamos que o outro faria conosco. E se espelho do outro reflete no meu espelho, os espelhos têm de ser dupla face e apenas um reflexo convidando a reflexão.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Mais ouvidos em menas bocas para a música brasileira

Depois de um pequeno debate em sala de aula, a respeito de produção musical brasileira, quase caio em gargalhadas quando um colega disse que não se faz música como antigamente e outros dois tiveram o disparate de inferir que nem se faz música no Brasil, ou que não temos uma produção musical digna que aplauso. Claro que não rir pelo inconveniente, mas muitas vezes o pré-conceito, ou mesmo a ignorância, devem ser respondidas com longas gargalhadas, pois são no mínimo ridículas. Ora, quem não conhece um mínimo de história de música brasileira, fica o convite de permanência na tolice.
O começo do sec. XX é de extrema importância na compreensão de representações artísticas (neste caso, a música) no Brasil. Não foi neste período que os negros, recém abolidos, depois de experimentos musicais híbridos, como a macumba, o maculelê, o batuque, criaram o que viria a ser a primeira manifestação musical autenticamente brasileira, que revolucionaria a música brasileira, o samba. Simultâneo a isto, os negros periféricos dos EUA, na ruas de Nova Orleans, criavam o jazz, para posteriormente o movimento bossa nova juntar samba e jazz e criar a própria bossa. Quem nunca se interessou por samba, em sua plenitude, deve dizer mesmo que o Brasil não produz música. Quem nunca ouviu Ismael silva, que não sabe da importância de Noel Rosa e Ari barroso, quem se quer entende a poética de grandes nomes importantíssimos na música brasileira, Dorival Caymmi e Luis Gonzaga, deve, sim, continuar no estereótipo que, aliás, serve de arcabouço para o pré-conceito tão tosco quanto seu dono.
É extremamente lamentável que não se conheça a história das cantoras de rádio, na Era de ouro, no Brasil. A época, anos 40 e 50, deixaram nomes imortais na história, que ainda hoje são regravadas por contemporâneos. Desde período, Aracy de Almeida e Elizete Cardoso, a primeira cantora a gravar um disco só com musica de Tom e Vinicius se destacaram como as damas do rádio. Não menos importante são Alaíde Costa, com sua voz triste que só canta música de lamentos, e Dolores Duran que morreu jovem, mas deixou A noite de meu bem, um clássico indiscutível.Neste mesmo período, meados dos anos 50, um movimento começa a surgir de forma tímida que toma dimensões planetárias, pela delicadeza do toque do violão e a peculiaridade da percussão, e um poética que exalta a mulher como ser perfeito: a bossa nova. Quem nunca ouviu Roberto Menescal e Silvia Telles, com o clássico Um barquinho um violão, que abre as alas para o movimento, deve insultar a si mesmo com as mesmas afirmações. Quem não sabe do respaldo que a bossa nova deu ao Brasil em questão de música, quem não sabe que quando se fala de jazz, a bossa é lembrada, quem não sabe que o Japão é o país onde se mais consome bossa nova e música brasileira no mundo, quem nunca ouviu falar em Ithamara Koorax, cantora brasileira, eleita por uma revista America especializada em jazz, a melhor cantora do gênero em 2006, revista cuja já teve outra brasileira nos anos 70 e tem João Gilberto sempre no topo desta lista. Deve não ser de conhecimento também que Pepel Gomes, baiano, está entre os dez maiores guitarrista do mundo, numa lista onde Jimmy Hendrix e B.B. King estão presentes.
A bossa nova é um gênero tão aclamado no exterior que Bebel Gilberto é a cantora brasileira que mais vende discos nos EUA. Outro brasileiro, Sergio Mendes, é uma dos cantores brasileiros mais populares neste país. Ella Fitzgerald gravou um disco só com músicas de Tom Jobim. Sarah Voughan gravou três discos de musica brasileira e dois com Milton Nascimento e Dione Wavick dedicou um disco com compositores brasileiros. Frank Sinatra gravou um disco com Tom Jobim e João Gilberto gravou dois com o saxofonista Stan Getz. Louis Armstrong já cantou ao lado de Elza Soares e Tom Zé gravou um disco também com David Byrne. Não estou dizendo que a musica brasileira é boa porque os americanos gostam, até porque temos o Japão para mostrar o contrário e a França que aclama Seu Jorge e Marcos Valle sem falar que Adriana Calcanhoto é referencia de musica brasileira em Portugal.Depois da era do rádio, a TV teve primordial importância na história da música, com os festivais de musica na TV, nada parecido com os ídolos ou Fama, claro. Destes festivais se revelaram Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Elis Regina, entre tantos. Abro parênteses para dizer aos atiradores de elite que pensam que “MPB” são estes quatros cantores acima citados, ao lado de Gal e Bethania que é, no mínimo, medíocre.Claro que o movimento tropicália tem fundamental importância, mas existem motivos e motivos para sua popularização, como o contexto político e cultural, afinal havia um movimento de contra-cultura importado neste movimento.
Penso que seja pertinente mencionar o movimento Clube da Esquina, no nos anos 70, que acontecera em Minas Gerais, ao qual está a frente Milton Nascimento, Lô e Macio Borges, Beto Guedes e Flávio Venturini, é impossível não citá-los aqui, pois foi o ultimo movimento notório antes do termino da ditadura. Ouve também um movimento em São Paulo chamado Vanguarda Paulistana com Arrigo Barnabé e Itamar Assumpção, cujo estes senhores de nobreza erudita nunca devem ter ouvindo se quer seus nomes.Seria pecado mortal se esquecer aquilo que não se esquece.
O Samba popular dos anos 60 e 70. Aqui, devo prestar reverencias a contribuição de senhores maiores para a solidificação de uma expressão musical autentica e perene ao qual Pixinguinha, Cartola, Adoniran Barbosa, Ataulfo Alves são representantes imortais desta época.Perece até que o espírito saudosista me invadiu, mas a contemporaneidade não deixa a desejar. Talvez até produzimos mais musica que antes, pois hoje a facilidade é maior que se gravar um disco que a algumas décadas. Para a nova geração, cujo alguns críticos chamam de nova música brasileira, Monica Salmaso e Ana Martins representam bem nossa cultura musical, fazendo de seus trabalhos uma contextualização do passado e presente. Na Ozzeti, Jussara Silveira, Roberta Sá e Bruna Caran, esta de apenas 21 anos, são obras primas e uma evidencia obvia que no Brasil se faz musica de qualidade sim, o que faltam, talvez são ouvidos e menos bocas para dizer o que não se sabem.
No Rio de Janeiro há um movimento bastante interessante que é o Soul Brasil, onde novos cantores utilizam do seu brilhantismo para fazer um trabalho legal, mesclando com o soul, funk, blues, jazz e samba. Desta ala, Max de Castro e Wilson Simoninha se destacaram, mas sem esquecer-se de Paula Lima e Funk Come Legusta, Luciana Melo, Jair Oliveira, Zé Ricardo, Claudio Zoli, Max Viana, Daniel Carlomagno, entre outros. Este movimento tem influencia diretamente de integrantes deste mesmo movimento, só que nos anos 70, que tinham Jorge Ben, TIM Maia, Cassiano, Hyldon, Carlos Dafé e Wilson Simonal, pai de dois da nova geração, como precursores.
Naturalmente que existem questões como uma indústria cultural, que degola a arte aqui em qualquer lugar, e comportamentos culturais de um povo que está relacionado, acredito eu, com o modelo educacional e com os parâmetros aos quais se estabelecem tais comportamentos. Agora é necessário que estas pessoas que acreditam ser mais letrada e consciente da realidade, dispam o traje do pré-conceito para compreender a mesma realidade de forma sensata. Estas pessoas, que parecem só conhecer Ana Carolina, Ivete Sangalo e Vanessa da Matta como representantes da música brasileira, devem realmente continuar na estupidez e esperar ver Naná Vasconcelos ou Adriana Deffenti no fim de semana na TV, ou que a revista Veja faça um notinha vagabunda sobre Syvia Patrícia, devem esperar as rádios populares fazerem entrevista com Max de Castro, pois não irá acontecer.
Uma forma de conhecer e compreender música brasileira é ouvindo a rádio Educadora(107.05), já que esta emissora não tem contrato com gravadora, portanto executa diariamente todos os artistas citados acima. Existem também sites especializados em (outra) música brasileira, que é o sintoniafina.com.br, de Nelson Motta, jornalista e produtor musical, que nutro profunda admiração. Aqui em Salvador, o Teatro Gamboa Nova, tem shows de quarta a domingo, com artistas baianos dentre eles Juliana Cunha e Virginia Prado; quem quiser acessa o site do teatro que tem a programação completa.
Enfim, apenas acredito numa máxima: a música brasileira precisa de mais(bons) ouvidos e (muito) menos bocas dizendo besteiras.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Pirataria e democracia- Estado omisso e indústria capitalista proporcionam a pirataria e o acesso universal da música

O debate acerca das novas tecnologias, que modificaram os padrões musicais em dimensão planetária, são inúmeros que, ora chega a um mesmo ponto, ora divergem-se. Se, por um lado, os artistas do som ganham maior liberdade, o mercado formal da música e seus mega-empresários choram suas perdas monetárias significativas.

A pirataria é uma realidade amargante para as gravadoras que tentam usar diversas estratégias para sobreviver a esta selva. Os truques são diversos: institucionalizar seu cast para manter certos artistas no auge de fama e garantir as vendas de seus discos; fazer aquelas chatíssimas regravações para arrancar até a alma de certos artistas, que só gravam aquelas músicas que o público sabe de cor. Isto- e muito mais- são algumas das saídas que a indústria fonográfica encontrou para sair do vermelho, que, por sinal, faz tempo que o sinal verde não abre, além, claro, da união de grandes empresas fonográficas, típico na ditadura capitalista quando a beira da falência.

A pirataria deve ser observada e analisada por diversos pontos de vista. Deve haver um empenho e um debate de profundeza maior, para que não fiquem apenas as gravadoras jogando para cima do Estado e este, em cima das gravadoras, pois ambos fazem da arte um instrumento de lucros e mais lucros e hoje vivem suas dores de cabeça. (E porque não no bolso?)

A pirataria de discos, pelos menos em que os discos são vendidos na forma física no comércio popular, pode ter diversos aspectos em seu contexto, tais como sociais e econômicos. Não adianta aumentar o preço para recompensar as baixas nas vendas, como fazem os editores de livros, pois é tão paliativo quanto ineficaz . Talvez se as gravadoras e o Estado tivessem um empenho sério sobre tal assunto, os impactos da pirataria pudessem ser menores, pelo menos. Se o Estado zerasse toda a carga tributária do disco, como deveria fazer com o livro, e as gravadoras diminuissem suas ambições pelos lucros, que chegam a ser exorbitante, poderíamos ter discos muitíssimo baratos e, quem sabe, até os próprios ambulantes venderem, de forma legal, os discos que pederia se tornar acessível a qualquer pessoa que passa numa passarela, em vez de ficar restrita aos que podem ir ao shopping.

Como é sabido de muitos, a internet, neste aspecto, traz uma aspecto importante que é a democratização da arte(a música), claro que certos grupos não estão interessados em democracia. Acredito que a arte, neste caso, a música, deve ser acessível a todos, independente de classes sociais ou gêneros musicais. O Estado deve se incubir de proporcionar o acesso da música a todos. A pirataria se resume, talvez, pela incúria que fez do Estado um agente omisso frente a realidade.