sexta-feira, 27 de junho de 2008

Discurso de um caipira nostalgico

Zezin, por que cê me pergunta que ando triste por demais? Mas eu vai te dizer, e que a vida não anda mei difici.As coisas já não é como era antigamente.Já chegando certa idade, eu, que já sou avô de sete netos, homem que vivi do que colhi da terra; colhi muita mandioca, feijão, mio;tudo de fartura, que, cê sabe, não faltava por aqui.Hoje ando meio que desencantado da vida, cê não sabe? Lembro quando nós dormia ainda de janela aberta pra entrar ar, um ventinho fresco, um brisa da noite, agente da cama só ouvindo os grilo cantar, só trancava quando chovia, ou quando as marditas da moliçocas invadia de noitinha, o bicha desgraçada!Mas, nesses tempo de modernidade, tudo desandou, que, valei-me deus, só ele mesmo para nos proteger.Outro dia mesmo, cê viu né, o filho do Zé Machado morto de tiro por três homem.Essas coisas me espanta Zezin.Agente achava que aqui, no interior, na roça, como nos outros lugares como esse aqui, era todo tranqüilo, calmo.Acordava as cinco com os galo cantando, tomava café preto com broa de mio, ou beiju que compade Tonho manda pra cá, e ia para roça pegar duro na enxada, sem reclamar de nadinha.As sete, de noitinha, tudo calmo e ia todo mundo dormir, ia para cama com a patroa namorar e o cansaço do dia ia todo embora. De quando em vez, ia no boteco do João tomar uma cachaça boa , jogar palitinho, ouvir e contar lorota, mas quando chegava em casa mei que tobeando de aruá, a patroa retava, era briga, mas tudo acabava bem, na cama, é claro.
È, Zezin, agora só resta recordar dos bons tempo, né, que já foi.Os meninos foram pra cidade grande tentar uma coisa mio, por que aqui não dá mais.A terra já não é como antes, a chuva já não cai mais como antigamente.E depois, Zezin, agora essa gente da cidade chega, cheio de pose, roupa das elegante, cabelo que parece que a vaca passou a língua, com uma conversa fiada, que ninguém entende nada, cheio de contrato par agente assinar, mas eu que não dou trela.Não sei não, acho meio esquisito, essa gente só anda de conversa com o prefeito, hum! Esse é outro.
È, Zezin, como eu dizia a vida na roça já acabou, agente ta aqui é por que não sabe viver em outro lugar, as coisas aqui não ta nada fácil não.
Nós não tem estudo então nos fica aí, a mercê; mas cê ver, nem a escola e descente aqui, as crianças andam para pegar a condução da prefeitura, mas volta com a cabeça aluada como se nem tivesse ido.Quem tem dinheiro, Zezin, manda os filho para cidade e depois volta doutor para mandar nos nossos, mas agente não pode contar com nada.Só imagino meus netos, que estão crescendo, que já não tem, praticamente, mas terra para plantar, cê sabe que tive que vender boa parte das terras por essas dificuldades, vendi as duas vacas antes que morressem, tadinhas.
As vezes acho que só quem tem o direito de viver é que tem dinheiro, Zezin.Pode mandar os filho para estudar, pode comprar tudo que quiser sem problema, muita vez sem necessidade e quando adoece não passa a desgraça que nós passa naquele hospital; é só pagar e pronto.E agente, que não tem mais força para viver, fica jogado as trapas; tenho vontade de mandar o galo para de cantar que não tenho vontade de acordar.Joana anda preocupada, mas anda aperreada como eu.
Agora, Zezin, entendi porque ando cabisbaixo, mas percebo que tu anda meio que aperreado também, mas deve ser pelo mesmo motivo, né?È, Zezin, é colocar nas mão de Deus, é se apegar nele, porque só ele e quem sabe de todas as coisas e tem misericórdia de nós.

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